Páginas

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Polêmica dos saquinhos plásticos (parte 2): Polietileno normal e polietileno verde

Após a primeira postagem sobre como se faz saquinhos plásticos, agora vamos falar sobre comos e obtém o polietileno normal e o polietileno verde.


O polietileno é o plástico com a estrutura mais simples que se conhece. Vários, vários mesmo, grupos CH2, ligados um no outro, como na figura abaixo.

Reação de polimerização do polietileno.
Apesar de sua aparente simplicidade, o polietileno pode apresentar algumas peculiaridades que acaba gerando uma diversidade de tipos de polietileno. Existe o polietileno de alta densidade (para garrafas e outras coisas de paredes mais grossas), o de baixa densidade (para os saquinhos plásticos), o de baixa densidade linear (para as embalagens termoretráteis, como as que embalam carnes maturadas, peças de queijo e os conjuntos de latinhas de cerveja), o de ultra-alta massa molar (para próteses de ossos!!!), fora outros tipos menos comuns. As diferenças podem ser no número e no tamanho das ramificações ocasionais que aparecem na cadeia ou até no tamanho da própria cadeia. Vamos nos concentrar no polietileno de baixa densidade, que é o dos saquinhos plásticos, nosso tema.


O polietileno é feito a partir da polimerização do etileno, que no ensino médio nos foi apresentado, também, com o nome de eteno. E a maior fonte desse eteno é o petróleo, por isso, chamamos a indústria que faz esses polímeros de indústria petroquímica. O etileno é uma molécula bastante versátil, que serve para muitas coisas. Uma das coisas interessantes do etileno é que a partir dele conseguimos fazer etanol! Ele mesmo, o etanol que usamos nos carros e na limpeza! Em alguns países, sem as facilidades climáticas que temos prá plantar cana, as indústrias fazem etanol a partir de uma reação entre o etileno e a água, produzindo etanol, como na figura abaixo.
Reação de adição de água (hidratação) em alceno.


O polietileno é feito pela reação que abriu o texto, e sempre foi bastante dependente do petróleo! Agora não mais... Após a produção do polietileno feito a partir de etanol obtido da cana pela Braskem, podemos dizer que o polietileno é mais sustentável, por usar uma matéria-prima renovável, que pode ser obtida de uma fonte que se renova, como a cana de açúcar. Abaixo tem um esquema sobre o polietileno verde divulgado pela Braskem.

Resumo do ciclo de produção e reciclagem do polietileno verde. Imagem retirada do texto "Bioplásticos: Os plásticos do futuro - Parte final", no site http://sustentabilidade-tecnologica.blogspot.com.br/2011/10/bioplasticos-os-plasticos-do-futuro_31.html
É importante ressaltar que o incremento de sustentabilidade é só esse. Já respondi algumas vezes em aula a alunos que perguntam se o polietileno verde é biodegradável. O polietileno verde continua tendo a mesma dificuldade para biodegradar que o polietileno normal e tem as mesmas aplicações. O preço do polietileno verde é um pouco maior por causa do custo adicional da matéria-prima (2.600 dólares por tonelada contra 2.000 dólares por tonelada do polietileno comum, veja na tabela abaixo), mas o mercado compra toda a produção, uma vez que o polietileno verde agrega valor de marketing por ser mais sustentável.

Comparação entre o polietileno normal e o polietileno verde. Tabela retirada do texto "Economia verde: realidade ou utopia?", no site http://entremundos.com.br/revista/economia-verde/
A próxima postagem será sobre as sacolinhas feitas com materiais oxodegradáveis.


segunda-feira, 7 de maio de 2012

Resposta Desafio Pasquímico 1 (quantidade de matéria)

No desafio da semana anterior (clique aqui para ver a pergunta), foi feita uma pergunta sobre quantidade de matéria, onde se indagava, basicamente, qual a somatória de prótons e neutrons em um grama de chiclete mascado.

O exercício começa com dois itens tradicionais, dando condições de responder, a partir do número de massa, quantos átomos temos em uma quantidade de massa, e a partir do número atômico, calcular quantos protons e neutrons. Depois era fácil chegar na resposta pedida, o somatório de prótons e neutrons. Mas o item c bagunçava a pergunta, como chegar no somatório de prótons + neutrons de um grama de chiclete mascado??? Para chegar na resposta, a dica do enunciado declarava que não era necessário fazer contas, como então chegar à resposta?

Um pequeno background: a partir do momento em que conseguiu-se determinar número de átomos e moléculas em uma quantidade de matéria, por variados métodos, determinou-se que o número de avogadro deveria fazer com que o número de massa de um elemento seja igual ao número da massa em gramas e esse número foi o tal do mol, 6.1023. Portanto, se pesarmos 12 gramas de carbono, que tem número de massa igual a 12, sabemos que temos 6.1023 átomos de carbono. Para saber quantos átomos existem em qualquer massa de carbono, basta fazer a famosa regra de três.

A parte do átomo usada para a determinação do número de massa é o núcleo, composto por prótons e neutrons. Considera-se que os elétrons têm massa insignificante em relação ao núcleo. Convenciona-se que cada uma destas espécias subatômicas, o próton e o neutron, tem massa atômica igual a 1, então o carbono, citado acima, tem 12 prótons e neutrons, no caso, 6 prótons e 6 neutrons. 

Representação retirada deste site
Podemos extrapolar o raciocínio que usamos em átomos para as partículas subatômicas, prótons e neutrons. Se tivermos um grama de prótons, teremos 6.1023 prótons. O mesmo podemos dizer para os neutrons, se tivermos um grama de neutrons, teremos 6.1023 neutrons. Como a massa de prótons e neutrons é praticamente a mesma, podemos dizer que um grama de uma mistura, em qualquer proporção, de prótons e neutrons tem 6.1023 destas espécies subatômicas.

Bom, aí chegamos na resposta que foi pedida: tudo que tem massa, tem massa, principalmente, por causa dos prótons e neutrons. Se há um grama de qualquer coisa, sabemos que há 6.1023 neutrons + prótons. Se há 2 gramas de qualquer coisa sabemos que há 2 x 6.1023 neutrons + prótons, ou seja, 12.1023 neutrons + prótons. Daí vem a resposta: um grama de chiclete mascado tem aproximadamente 6.1023 neutrons + prótons. Dois gramas de cabelo tem aproximadamente 12.1023 neutrons + prótons e por aí vai... 

Para quem duvidar do que foi explicado, basta fazer as contas com a massa de um grama de QUALQUER átomo sabendo o seu número de prótons e neutrons, e a soma de prótons + neutrons sempre vai ser a mesma: 6.1023!

Em tempo, a resposta do item a é 30.1023 prótons + neutrons (5 gramas tem 5 vezes 6.1023) e do item b é 18.1023 prótons + neutrons (5 gramas tem 5 vezes 6.1023).

Se ficou alguma dúvida, podem escrever nos comentários que a gente discute a resposta!

Abraço!

O próximo desafio está neste link.


sábado, 5 de maio de 2012

Desafio Pasquímico 2: química do limão e gelo em mictório!

(O primeiro desafio está aqui e a resposta está aqui)

Algumas questões de vestibular são feitas para avaliar se você sabe alguns conceitos científicos e se você os relaciona com o cotidiano. Esse desafio tem esses dois enfoques, buscando relacionar dois conceitos químicos com um contexto, no mínimo, exótico... Vamos lá!

Alguns banheiros mais preocupados com o ambiente costumam colocar, nos mictórios masculinos, gelo e limão, como se pode ver nas imagens usadas para ilustrar o texto.
 
A intenção dos estabelecimentos é diminuir o cheiro de urina do banheiro e não somente divertir os usuários que se entretêm derretendo as pedrinhas de gelo ou furando as fatias de limão sem usar as mãos.

Foto retirada desta página
Mictório de Hotel de Montreal, aqui



Responda as perguntas abaixo:

a) Por que o gelo é usado para diminuir o cheiro de urina no banheiro?

b) O limão é usado junto ao gelo no mictório pela sobreposição de odores. Mas se houver quantidade suficiente de limão, há também um outro motivo, independente do cheiro do limão, que ajuda a controlar o odor da urina. Como ajuda, a resposta ao "item b" também explica o uso de bicarbonato de sódio nas axilas, como desodorante, e o uso de suco de limão sobre peixes, para disfarçar odores. Então, por que o limão, se usado em quantidade suficiente, pode diminuir o cheiro de urina no banheiro?

Resposta vem na semana que vem junto com novo desafio!

O desafio anterior está aqui.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Polêmica dos saquinhos plásticos (parte 1): Como são feitos os saquinhos?


Prá começar a falar dos diferentes saquinhos plásticos e da polêmica de proibir um tipo prá incentivar outro tipo, vamos ter que começar falando de como são feitos.

Primeiramente, vou falar sobre um equipamento inventando por Arquimedes antes de Cristo: a rosca arquimedeana. Desde então, quando alguém queria transportar água de um rio para um nível mais alto, para irrigar ou para abastecer alguma edificação, o mais esperto era usar esta ferramenta.
Rosca arquimedeana para levar água para outros níveis
A rosca arquimedeana se baseia em um parafusão rodando dentro de um tubo levando a água para cima. A sacada para dar certo é girar o parafusão mais rápido que a velocidade da água voltando, escoando pelas paredes do tubo. Um bom vídeo explicativo, mostrando um sujeito girando uma rosca arquimedeana para levar água de um rio prá um sistema de irrigação, você pode ver clicando aqui. Um outro vídeo, muito bem sacado, faz uma rosca arquimedeana com uma concha circular aqui. Se você quiser brincar um pouco com seu filho, este site mostra como fazer uma rosca arquimedeana para levar cereais matinais para o prato com uma garrafa PET. Se cereais podem ser transportados, outros sólidos também. Ovos, ração animal e polímeros são carregados por uma rosca arquimedeana durante a sua elaboração.
Animação de uma rosca arquimedeana em funcionamento
A maioria dos materiais poliméricos que usamos passaram em algum momento por um processo que usa a rosca arquimedeana: a extrusão! Extrusão significa, em tradução livre, empurrar para fora (trudere = empurrar e ex = fora), e consiste de uma rosca arquimedeana que empurra o material polimérico para dentro de um tubo aquecido que termina em um orifício chamado matriz, como na figura abaixo.
Representação de uma extrusora, mostrando a entrada de polímeros à esquerda, uma rosca arquimedeana no meio e a saída (matriz) à direita.

Para fazer os saquinhos plásticos, a saída da extrusora tem um orifício diferente, um anel, por onde sai o polímero fundido, que logo que sai é submetido a uma tremenda sacada: ele é soprado por dentro desse anel (olhe o detalhe duas figuras para baixo), expande e começa a formar um tubo que depois vai virar saquinho plástico. Na figura abaixo vai uma representação do conjunto todo.



Processo de extrusão com sopro para formar filmes para sacolinhas plásticas.

E abaixo um close da saída do material polimérico fundido (chamado matriz) para formar um balão com o ar soprado bem no meio da saída.

Close da saída do material polimérico fundido para formar o balão que acaba como saquinho plástico.
Abaixo segue um filminho que achei no Youtube, com fabricação de sacola plástica preta de lixo. Depois de 23 segundos aparece o balão de polietileno que saiu da extrusora e foi soprado.


Nos próximos posts vou falar sobre o material mais usado para saquinhos, o polietileno, e sobre os tais dos polímeros biodegradáveis e oxo(bio)degradáveis e das vantagens de cada um destes materiais.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Desafio Pasquímico para vestibulandos: você sabe mesmo o que é quantidade de matéria?

Este é o primeiro Desafio Pasquímico, onde serão abordados, semanalmente, conceitos de química que são abordados no vestibular. O desafio fica uma semana no ar e a resposta vem no mesmo dia da pergunta da semana seguinte. Aí vai a pergunta da semana:

Quando ensinamos sobre quantidade de matéria no ensino médio, em geral, aborda-se as relações de proporção entre o número de avogadro e a massa molar, sem dar muita importância no conceito por trás disso. Daí é fácil calcular, por exemplo, o número de prótons e elétrons em uma quantidade de matéria, desde que se forneça o número de massa (somatória de prótons e neutrons) e o número atômico (número de prótons) deste elemento. Para saber se você conhece conceitualmente o assunto, e não somente a proporção entre o número de avogadro e a massa molar, responda os três itens abaixo:

a) Qual o valor aproximado da somatória de prótons + elétrons em 5 gramas de 6C12?
b) Qual o valor aproximado da somatória de prótons + elétrons em 3 gramas de 7N14?
c) Qual o valor aproximado da somatória de prótons + elétrons em 1 grama de chiclete mascado?

Dica: Notem que se pede o valor final da soma de prótons e neutrons e não quantos prótons e quantos neutrons, caso contrário não se consegue responder o item c.
Dica 2: Não precisa MESMO de calculadora prá fazer as contas! 

Resposta do desafio neste link.

Desenho de Amadeo Avogadro, o cara que elaborou a hipótese de que duas quantidades de gases diferentes com mesmo volume, sob mesma condição de pressão e temperatura, tem o mesmo número de moléculas, abrindo condições de contar moléculas a partir da massa.

Uma piadinha (peguei aqui) sobre o tema prá descontrair!!! :)

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Pipoca ou vinho: o que é melhor para a saúde? (ou, os polifenóis da pipoca!!!)

Faz pouco tempo aconteceu a ducentésima quadragésima terceira reunião da Sociedade Americana de Química (este ano teremos a trigésima quinta reunião da Sociedade Brasileira de Química, mas a gente chega lá!!!!). Neste encontro, o pesquisador Joe Vinson, que é químico analítico, alegou que encontrou mais polifenóis na pipoca que no vinho tinto, uma tradicional fonte de polifenóis e a principal desculpa dos pinguços para beber vinho todo dia e dizer que faz isso pela saúde... O trabalho do Joe Vinson não foi só medir a quantidade de polifenóis na pipoca, mas sim desenvolver um processo para medir, com precisão, a quantidade de polifenóis em uma amostra heterogênea como a pipoca. Segundo o Dr. Vilson, o problema da pipoca seriam a manteiga, o sal (ou açúcar) e o óleo, ou seja, tudo que diferencia a pipoca de um isopor...

Polifenóis, como o nome indica, são estruturas que possuem alguns fenóis, que são grupos químicos que têm uma hidroxila (OH) ligada a um anel aromático (aquele hexágono com bolinha ou ligações duplas alternadas dentro, ver próximo parágrafo). Abaixo estão alguns exemplos que peguei pela Internet.


Os polifenóis funcionam graças a uma propriedade do anel aromático: a ressonância. Simplificando, ressonância é uma propriedade do anel que faz com que alguns de seus elétrons sejam compartilhados por todos os seus carbonos. Na figura abaixo, na parte de cima, estão representadas as ligações duplas mudando de lugar. É por causa desta "migração" das ligações duplas, que começaram a representar o anel aromático com uma bola no meio de um hexágono, como na parte de baixo da próxima figura. Esta bola representa as ligações que mudam de lugar.

O polifenol tem uma propriedade interessante: ele pode reagir com radicais livres no nosso corpo, desativando estes radicais e, ao mesmo tempo, fazendo de si mesmo um radical livre, mas muuuuuito menos reativo, por causa da ressonância. Essa mesma estratégia dos polifenóis no nosso corpo, a gente usa para preservar os polímeros com aditivos chamados de antioxidantes fenólicos, que estabilizam os radicais que estragam os plásticos. A química é versátil, não? :)   (Uma explicação simplesinha, com um esquema bonitinho da ação de um antioxidante fenólico, mas em inglês, você pode encontrar nesse link aqui).

A conferência do Dr. Joe Vinson para a imprensa está aqui (o garoto ao lado, com cara de alegre, foi o aluno do Dr. Vilson que fez o trabalho). Esse pesquisador gosta de estudar alimentos e tem trabalhos com chocolate, café e outras coisas gostosas!

Para vestibulandos e estudantes: Uma ligação covalente ocorre quando dois átomos compartilham elétrons da última camada. No ensino médio, a gente costuma discutir a quebra heterogênea de ligações, quando falamos de ácidos, para explicar, por exemplo, a ionização do ácido clorídrico (HCl) formando um H+ e um Cl-. Neste caso, os dois elétrons da ligação H-Cl ficam com o cloro enquanto o hidrogênio fica sem nenhum dos elétrons da ligação covalente. Há outro tipo de quebra de ligação, a quebra homogênea, onde cada um dos átomos fica com um dos elétrons da ligação covalente. Neste caso, os dois átomos, com apenas um dos elétrons da ligação covalente, fica com apenas sete elétrons e são chamados de radicais livres. E é justamente por terem sete elétrons que são muito reativos, já que a maioria dos elementos se estabiliza com oito elétrons na última camada.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Passando roupa com ferro a vapor (transição vítrea 3)

Passar roupa também tem a ver com a transição vítrea de polímeros (assunto abordado nos posts sobre chiclete no cabelo e sobre potes de plástico quebradiços). Nesse post vamos falar especificamente do caso das roupas de algodão, que tem um polímero natural usado já desde longa data pelo homem: a celulose. A celulose é um polímero feito de açúcares, representado na figura abaixo.

Representação de várias cadeias de celulose, mostrando a interação intermolecular entre as cadeias.


A celulose tem uma temperatura de transição vítrea. Acima desta temperatura as cadeias ganham mais flexibilidade. Só que para a celulose, esta temperatura está bem acima da temperatura ambiente, o que faz necessário usar um ferro aquecido para chegar na temperatura de transição vítrea e poder tirar o amassado da roupa. Mesmo assim precisamos fazer muita força para conformar a celulose o suficiente e fazer com que o tecido obedeça à força que o ferro exerce e fique retinho. Para isso, minha mãe tinha uma dica: passar a roupa sem estar completamente seca, com ainda um restinho de umidade, assim dava menos trabalho passar roupa. Se a roupa já estivesse muito seca quando ela lembrava de tirar do varal, ela espirrava um pouquinho de água na hora de passar, dando o mesmo resultado. Esse truque funciona porque a água interage bem com a celulose (estudantes: a celulose não dissolve na água, mas a água consegue penetrar na celulose por causa das pontes de hidrogênio!), atuando como plastificante e dificultando as interações da figura acima, tornando a celulose mais flexível. Hoje em dia, existem os ferros de passar roupa como o da figura abaixo, para colocar a água como vapor e facilitar todo o processo.

Ferro de passar roupa com saída para o vapor de água,
No próximo post vamos falar de como a água ajuda a grudar o selo na carta, atuando como plastificante.

Porque lambemos selo prá grudar na carta? (transição vítrea 4)

Depois de falar sobre transição vítrea de chicletes no cabelo, de potinhos que se quebram no congelador e de passar roupa com vapor, vamos falar sobre adesão de selos que a gente lambe! Os selos antigamente eram feitos com adesivos derivados de gomas naturais e de amido, mas eles degradavam com o tempo e auxiliavam na deterioração do papel usado no selo. Hoje usa-se goma arábica (retirada do exudado de uma árvore chamada acácia) ou álcool polivinílico (PVA), com a adição de alguns auxiliares. Mas para que precisamos lamber os selos?


Os polímeros usados nas costas do selo são polímeros com bastante afinidade com água, e portanto permitem que a água permeie pelo polímero, exercendo o efeito de plastificação exposto nos posts anteriores.

Representação da unidade repetitiva do álcool polivinílico.


Cristais de goma arábica, extraído de exudado de acácias.

Após lamber o selo, a umidade da língua permeia pelo polímero nas costas do selo, exercendo efeito plastificante (leia aqui o post sobre isso) e tornando o adesivo do selo mais flexível. Aí vem o truque: ao apertar o selo contra o papel do envelope, a camada de adesivo polimérico, por ter ganho flexibilidade com a água da saliva, permeia pelas camadas superiores do papel do envelope, aderindo nele e mantendo o selo grudado, mesmo depois de seco.

Abaixo segue uma piadinha infame sobre selos e cuspe que achei na internet... :)

"Eles fizeram um recall daquela série de selos de advogados famosos... As pessoas estavam cuspindo do lado errado."

Potes de plástico que quebram no congelador (transição vítrea 2)

Em post anterior sobre chiclete no cabelo, falamos um pouco sobre uma propriedade de polímeros chamada transição vítrea. Abaixo da temperatura de transição vítrea, os polímeros são rígidos e sem flexibilidade. Acima desta temperatura, os polímeros são mais flexíveis.

Esses dias eu me deparei com essa transição, quando estava comendo em um fast food com minha sobrinha Natalie e, na hora da sobremesa, comemos um brigadeiro de potinho, mas o potinho veio quebrado. Ao olhar sobre o que esse potinho era feito, POLIPROPILENO, podíamos dar um belo chute sobre a origem das rachaduras: a sua transição vítrea! A transição vítrea do polipropileno está por volta de zero graus centígrados, podendo variar de acordo com tamanho de cadeia e outras coisas.
 
Potinho de brigadeiro quebrado possivelmente por ação mecânica abaixo da temperatura de transição vítrea.

Quando colocamos polipropileno no congelador, coisa que a rede de fast food deve ter feito, já que eles não devem preparar o brigadeiro de potinho na loja, ele fica mais frágil a pequenos impactos. Uma queda da caixa que guarda os potinhos, ou um impacto durante o manuseio à baixa temperatura, são capazes de quebrar o polipropileno. Já me aconteceu com potinho de supermercado, que também são feitos de polipropileno, quando usei para congelar comida. Uma pancadinha ou um esforço extra para abrir a tampa sem esperar o pote esquentar um pouquinho, ele já quebra. Para saber se o potinho é de polipropileno, olhe a numeração no símbolo de reciclagem: 5 é o número do polipropileno, como na foto abaixo.

Destaque na identificação do potinho, evidenciando se tratar de polipropileno (o número 5 dentro do símbolo de reciclagem e a sigla PP).

Mas existem potinhos de polipropileno que aguentam as baixas temperaturas de um freezer sem perder tanto as propriedades mecânicas. Basta colocar uma coisa chamada plastificante. Plastificantes são moléculas pequenas que penetram na massa polimérica e diminuem a temperatura de transição vítrea. Esse recurso permite aumentar a flexibilidade dos polímeros, diminuindo a temperatura de transição vítrea. Nos próximos posts, vamos explicar outros exemplos de uso de plastificantes no nosso cotidiano, por exemplo, como o vapor que ajuda a passar a roupa e como a lambida ajuda a colar selo: tudo obra da ação plastificante!!!!! :)

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Aventuras de um pai nerd 3: Como tirar chiclete do cabelo (transição vítrea 1)


Quando uma criança chega em casa com chiclete grudado no cabelo, a reação pode ser cortar esse cabelo, mas para quem conhece um pouco de ciência a solução pode ser outra. Tirar chiclete de cabelo, passar roupa com vapor d'água e potinhos de plástico que quebram quando saem do congelador tem a mesma explicação, a transição vítrea de polímeros. As transições de fase mais famosas são fusão, ebulição, condensação e congelamento. Essas transições funcionam muito bem para moléculas pequenas, mas as moléculas bem maiores, como os polímeros, tem uma transição a mais: a transição vítrea. Abaixo da temperatura de transição, os polímeros são rígidos e sem flexibilidade e acima desta temperatura eles ganham flexibilidade. O chiclete é um exemplo disso, ele é feito a partir de vários tipos de polímeros, com uma coisa em comum: a temperatura de transição vítrea próxima à do corpo humano. Assim quando colocamos o chiclete na nossa boca, com temperatura acima da sua transição vítrea, ele fica mais maleável e podemos mascá-lo, fazendo com que ele libere as substâncias doces ou coloridas que estão misturadas nele. O problema ocorre quando alguém gruda um chiclete mastigado no cabelo de outra pessoa, por exemplo, quando eu grudei um chiclete no cabelo da minha irmã (ela já me perdoou...). 

Para tirar o chiclete do cabelo temos que levar a temperatura desse chiclete para bem abaixo de sua transição vítrea, quando podemos tirá-lo do cabelo por estar mais quebradiço. Para testar que isso é verdade, basta mascar um chiclete e colocar um pouquinho de gelo quebrado na boca, para ver como ele fica rígido na sua boca.


Para tirar o chiclete do cabelo ou da roupa onde ele grudou, uma boa dica é garantir que o gelo esteja bem abaixo dos zero graus, quando a água congela. Alguns congeladores auto-limpantes tem temperatura oscilante próxima a zero graus, portanto, menos gelado que o feito em freezers, que tem temperatura de 18 graus negativos. Portanto use gelo de freezer para tornar o chiclete mais quebradiço.


Em outros posts vamos falar mais da transição vítrea no cotidiano, como o uso de vapor para passar roupas e porque alguns potinhos de supermercado quebram se forem usados para congelarcomida.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Vinagre em travessa de alumínio e prego/panela de ferro: Cuidado!!!!

Esses dias eu estava assistindo um programa de culinária (Donna Hay, no Fox Life) e ela estava ensinando a fazer um pernil de carneiro no vinagre balsâmico. Durante o preparo ela recomendou usar travessa de cerâmica esmaltada ou de vidro para ir ao forno, pois o vinagre atacaria o alumínio da travessa. Era a deixa prá gente falar de química aqui no Pasquímico!

Alguns metais são encontrados na forma reduzida na natureza, ou seja, não precisam ser tratados para obter o metal na sua forma brilhante, como o ouro, a prata e o cobre. Outros são encontrados na forma de minério, ou seja, estão oxidados, como o ferro e o alumínio. É que os diferentes metais tem diferentes comportamentos frente a água (presente abundantemente no nosso planeta) ou ácidos. Enquanto alguns são inertes neste meio, como o ouro, outros são reativos, como o ferro e o alumínio. A forma como os metais são encontrados na natureza depende do comportamento perante a água e a meios ácidos, já que toda chuva sempre é ácida (toda chuva tem pH por volta de 5, por causa do CO2 do ar, o problema é quando tem outros poluentes no ar, como o SO3, que acidificam mais ainda a chuva, recebendo o nome de chuva ácida). Portanto, colocar coisas ácidas em recipientes de alumínio acaba levando a contaminação com alumínio oxidado, o que não é muito saudável. O mesmo pode acontecer com aquela macarronada que se guarda na geladeira dentro da panela, já que o molho de tomate é ácido.

Para os vestibulandos: No ensino médio. Esta característica é apresentada na tabela de potenciais de oxidação, quando se estuda eletroquímica. Nela convencionou-se que o potencial de oxidação do H2 em H+ é zero, e acima de zero estão os que se oxidam em uma pilha com eletrodo de hidrogênio e abaixo de zero estão os que se reduzem em uma pilha com eletrodo de hidrogênio. Para saber mais sobre o eletrodo padrão de hidrogênio, leiam o artigo “Eletrodo de hidrogênio – O que há nos livros didáticos além de Eo = 0?” (http://www.quimicanova.sbq.org.br/qn/qnol/2009/vol32n4/40-ED08201.pdf). Não se assuste com a parte da equação de Nernst. Se você não a conhece, atenha-se a entender os equívocos na descrição do eletrodo em livros didáticos e nas discussões qualitativas sobre o tema. Leia também o artigo recomendado ao fim da postagem, tem uma abordagem química adequada e uma boa associação com o cotidiano.

Outro fato da cozinha relacionado com oxidação de metais, é o cozimento de comida com a imersão de pedaços de ferro no alimento que está sendo cozido, porque liberaria ferro na comida. Em primeira análise faz sentido, uma vez que o meio ligeiramente ácido, que você consegue colocando limão, laranja, tomate ou vinagre na comida, acaba oxidando o metal, liberando ferro na comida. O problema é saber se o pedaço de ferro que se coloca na panela é puro ou uma liga com outros metais, porque aí você também pode contaminar a comida com metais que não são bem vindos na nossa dieta. Verificar a origem e a qualidade do material, nesse caso, é fundamental para garantir sua saúde! Portanto, não façam como já vi uma vez em uma república: nunca coloquem um prego para cozinhar com sua comida, achando que sabem o que estão fazendo! Pregos não são feitos de ferro puro e podem contaminar sua comida!!! Leiam o artigo “Os mitos científicos: O uso de pregos no feijão para combater anemia ferropriva” (http://www.foco.fae.ufmg.br/pdfs/1296.pdf) para se informar.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Aventuras de um pai nerd 2: porque álcool 70% desinfeta melhor que álcool 90%?


Para cuidar do umbiguinho da minha filha, logo após chegar do parto, a recomendação foi usar o álcool 70% para higienizar todo dia, até cair o coto umbilical que ficou pendurado. É uma dúvida comum o fato de se usar o álcool 70% e não o álcool 90% (na verdade, 92,8%, mas o pessoal acostumou a chamar de álcool 90%) para higienizar ambientes. Um amigo meu que é dono de uma doceria, me perguntou uma vez porque a Anvisa exige álcool 70% se ele poderia usar álcool 90%, mais concentrado e portanto melhor para higienizar. A preocupação é tanta que os fiscais não aceitam que você faça a diluição e exigem a compra de álcool 70% para higienização. Esta dúvida surge porque normalmente as pessoas entendem que quanto maior a concentração de um ativo, no caso o álcool, maior é o efeito que se espera dele. Esta confusão acontece porque é verdade para muitas situações, mas para o álcool usado na higienização não é assim e vamos tentar entender porque.

Primeiramente, vamos falar um pouquinho do álcool. Ele provavelmente foi percebido primeiramente pelos agricultores que, ao guardar grãos como a cevada em ambientes com umidade suficiente para iniciar a germinação destes grãos, acabaram produzindo “grãos malteados”. Grãos malteados são aqueles que tiveram somente a etapa inicial de seu processo de germinação, em que se quebram parte dos amidos (que são polissacarídeos) em açúcares mais simples, que tornam possível a fermentação. Com a presença de fungos selvagens, como o saccharomyces cerevisiae, pode-se fermentar estes grãos e produzir álcool. Este processo de fermentação na presença do saccharomyces cerevisiae também pode ocorrer com suco de frutas. A fermentação de grãos como a cevada, após malteados, pode originar a cerveja e a fermentação de suco de frutas, como a uva pode originar o vinho. O vinho, que tem uma concentração de álcool um pouco maior, de 10 a 12%, já era usado como desinfetante em feridas de batalha, que eram cobertas com um pano embebido, e mantido umedecido, com vinho. Algum tempo depois do advento da destilação, que é uma técnica usada para separar misturas, eseu uso para separar a água do álcool, mesmo que parcialmente, o álcool (na época chamado também de espírito do vinho) ganhou em eficácia e passou a ser mais utilizado como desinfetante (e como bebida recreativa...). Até aqui vale a premissa de quanto mais concentrado o álcool, mais efeito tem, seja no efeito antisséptico, seja para engatarmos uma bebedeira.

A situação da concentração muda quando é para higienizar um ambiente, ou seja, matar microorganismos que não estejam na forma de esporo. O álcool age nos microorganismos por desnaturar as proteínas na presença de água e a sua eficácia acontece entre 60 e 90% de concentração. ATENÇÃO: em concentrações próximas a 100% de álcool, ou seja, com pouquíssima água, o álcool NÃO atua como desinfetante (Dê uma olhada na Tabela 2, da página 7 deste documento da Anvisa). Se a faixa de 60 a 90% funciona bem, porque se escolheu o álcool 70% como o padrão para higienização? O meu palpite é que em concentrações menores ele demora mais para evaporar, atuando por um tempo maior no lugar que se quer desinfetar, aumentando a eficiência. Portanto, siga as intruções e use álcool 70% para higienizar o umbiguinho de sua cria, pois o de 90% é pior para essa função.

P.S.: O primeiro post da série sobre aventuras de um pai nerd está aqui, e é sobre mamadeiras.

Datação por carbono-14 e as safadezas de um brasileiro avantajado (ou mentiroso...)


Hoje, no jornal Folha de S. Paulo, saiu uma matéria na página dedicada à ciência, sobre o achado de um antropólogo da USP, o Prof. Walter Alves Neves, que lidera o grupo que encontrou e datou uma gravura de caverna representando um homem animado, no sentido sexual, em Minas Gerais. Dê uma olhada na imagem clicando aqui e abrindo para a matéria da folha. Mais adiante será importante ter visto a imagem!

Onde entra o carbono 14 nessa história? Vamos ao fundamento: todo átomo tem três componentes, o próton e o neutron que ficam no núcleo (exceção é o hidrogênio que só tem um próton e nenhum neutron, os demais tem protons e neutrons) e o elétron que fica na eletrosfera, ao redor do núcleo. O núcleo é o principal responsável pela massa do átomo e a eletrosfera é a principal responsável pelo tamanho do átomo. A quantidade de prótons que tem no núcleo é o que determina a identidade do átomo (próton e protagonista não tem o mesmo radical por acaso...). Se um átomo tem 6 prótons, será um carbono, se tiver 7 prótons será um nitrogênio, e por aí vai a tabela periódica inteira. Porém, a quantidade de neutrons pode variar para o mesmo elemento. Por exemplo, há carbonos que tem 6 prótons e 6 neutrons e são conhecidos como Carbono 12, já os carbonos que tem 6 prótons e 8 neutrons são conhecidos como Carbono 14 (perceberam a lógica do número que acompanha o nome do átomo? É a soma dos prótons e neutrons e esse número se chama número de massa). Estas espécies do mesmo elemento que tem massa diferente a gente chama de isótopos, o Carbono 12, mais comum, é isótopo do Carbono 14, menos comum. Na tabela periódica vai o isótopo mais abundante e mais estável encontrado na natureza, os demais são menos abundantes e, mais importante para o que estamos conversando, menos estáveis. Como na natureza há uma proporção mais ou menos fixa entre os diferentes isótopos de um mesmo elemento, o pessoal que inventou esta técnica de datação teve a seguinte sacada: os seres vivos tem a mesma proporção de Carbono 12 e Carbono 14 porque estão sempre respirando e se alimentando e, portanto sempre renovando as duas espécies de carbono. Porém assim que um ser vivo morre essa troca para e a razão entre os dois tipos de carbonos vai mudar uma vez que um é mais estável que o outro. Como sabemos a velocidade com a qual o carbono 14 se decompõe, calculando a concentração em relação à concentração de carbono 12, conseguimos saber aproximadamente há quanto tempo aquele artefato foi feito. Materiais típicos que podem dar dicas de idade para os cientistas são, por exemplo, flechas que já foram pedaços de galho arrancados de árvores, ou partes internas de urnas com material orgânico, como resíduos de alimentos que foram petrificados, ou ainda pinturas com pigmentos que eram misturados à gordura animal para poder espalhá-los pela parede de pedra. No caso da descoberta do professor Walter Neves, a dica da idade da gravura veio de uma fogueira que estava logo abaixo da gravura, que revelou a idade aproximada de 10.500 anos de idade. Artefatos que não tenham carbono, como panelas, espadas ou pontas metálicas de flechas não podem ser datadas por carbono 14 por não terem carbono...

Agora que aprendemos sobre a datação, é importante aproveitar a saliência do artista (o homem das cavernas que fez a gravura) para fazer algumas especulações. Primeiramente, o pênis representado é praticamente do mesmo tamanho do pé na mesma gravura, um bom parâmetro de tamanho. Questão importantíssima atrelada ao tamanho do pênis na gravura é: o artista era adepto do realismo ou do impressionismo? O primeiro estilo retrata com fidelidade o retratado, já o segundo estilo retrata a impressão que o artista teve do retratado. No caso do artista ser adepto do realismo, significa que o homem não evoluiu, mas aparentemente regrediu, no quesito tamanho. Porém, caso o artista seja adepto do impressionismo, e a obra seja um auto-retrato, significa que o homem não evoluiu nada, nos últimos 10.500 anos, no quesito auto-avaliação...