Fui me preparar para escrever este
post sobre protetores solares, e imaginei que a limitação dos vampiros de
exposição ao Sol poderia ser um boa desculpa para falar de protetores solares.
De início fui procurar algo de interessante sobre vampiros e achei alguns
documentos interessantes na Internet, desde o site da
Agência Federal de Vampiros e Zumbis a um artigo da
Annals of Improbable
Research (a revista que promove o
Prêmio IgNobel), o “
The Chemical and Physical Properties of Vampires in the Gaseous State”.
O primeiro veste a bobagem sobre vampiros com roupagem científica (se podemos
chamar de ciência...). O segundo usa a ciência para “viajar” em alguns dos
mitos que cercam os vampiros. O segundo foi bem mais legal de ler e certamente
é muito mais interessante para alunos de ensino médio e estudantes universitários que queiram usar os conhecimentos aprendidos sobre gases em um contexto divertido.
Feita a recomendação de leitura
acima, vamos falar de algumas coisas interessantes sobre a relação que poderia
existir entre vampiros e protetores solares. Sabemos que vampiros têm aversão à
luz solar e nos filmes a reação à luz do Sol se divide em duas categorias
principais: na primeira, mais comum, a dos vampiros burros, que explodem, pegam fogo ou brilham
e viram cinzas, e na segunda, a dos vampiros malandros, que usam anéis ou colares
místicos que “blindam” contra o Sol (historinha prá boi dormir...). Para
entender porque há roteiristas que insistem em colocar os vampiros em filmes
para morrer queimados, vamos tentar entender melhor como o homem se protege do
Sol.
Todos que já tiveram a
experiência de torrar um pouco ao Sol sem proteção, especialmente os
branquelos, sabem que isso não dá certo. Claro que isso não é de agora e até os
homens da caverna branquelos tinham seus momentos de vermelhidão. Provavelmente,
a primeira coisa que inventaram foi a sombra portátil individual, hoje
conhecida como chapéu ou boné. Assim eles podiam levar a sombra por onde
andassem sem se expor diretamente ao Sol. Claro que a sombra portátil poderia
cair, ser roubada ou voar durante a corrida atrás de comidas que se mexiam (até
o advento da agricultura, o homem sempre teve que pastar (ops!) atrás de outros
animais para comer), e aí os homens ficavam sem a proteção da sombra portátil.
Por observação de outros animais como hipopótamos, elefantes ou rinocerontes (ou
os equivalentes da época), sempre se soube que a lama serve para refrescar, e
após seca, para proteção contra o Sol.
Inspirados por esta esperteza animal, e talvez
por uma necessidade reprimida de se enfeitar, o homem inventou as tinturas de
guerra e de caça, permitindo proteção sem as limitações impostas pelas sombras
portáteis. Estas tinturas são muito parecidas com o que se chama em inglês de Sun block (bloqueador solar), que é uma
das modalidades de proteção que temos hoje, que chamamos de proteção física. Funciona como barreira física à luz
do Sol, que acaba refletida após incidir sobre a lama de antigamente ou sobre a
dispersão de óxido de zinco ou de titânio que se usa hoje em dia. Apesar desta
tecnologia estar disponível há muito tempo, os vampiros, que são muito burros,
não betumam as partes expostas para sair de dia e chupar uns pescoços por aí. Talvez
porque os vampiros sejam muito vaidosos e esse tipo de proteção diminua o
valor estético do usuário. Abaixo , por exemplo, podemos ver Brad Pitt em Cannes,
usando este tipo de proteção ao Sol...
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Brad Pitt, protegido contra a exposição ao Sol, acenando para os fãs |
Bom, apesar de deficiente do
ponto de vista estético, esta foi a proteção mais usada pelas pessoas que
queriam ficar expostas ao Sol, até que um químico austríaco, Franz Greiter,
após escalar uma montanha e ganhar um vermelhão na cara, inventar uma nova
tecnologia: o protetor solar. Ele sabia que a luz do Sol é uma mistura de vários
tipos de luz, com diferentes comprimentos de onda, ou seja, tem infra-vermelho
(que esquenta), tem luz visível (que a gente vê...) e tem ultra-violeta (que
faz mal!). Aí ele teve a sacada de misturar uma substância que absorvesse a parte
da luz do Sol que machuca com um creme ou óleo que permitisse espalhar essa
substância sobre a pele: estava criado, em 1938, o primeiro protetor solar com outra modalidade de proteção, a proteção química!
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Duas
fotografias de um homem usando protetor solar (FPS 50) na metade
esquerda do rosto. À esquerda ele está sob luz visível e à
direita ele está sob luz ultravioleta. O protetor solar no
lado esquerdo do rosto absorve
radiação ultravioleta, mostrando a ação do filtro solar |
A substância que ele usou, o
ácido para-aminobenzóico (PABA), absorve parte do ultra-violeta, mas permite
que a luz na região do visível e do infravermelho passem, sem dar a bandeira que a proteção física proporciona. O limite desta técnica é que o PABA só absorve parte da região do ultravioleta, mas, pelo menos, é a parte mais perigosa.
Agora vamos fazer um exercício de raciocínio sobre a relação dos vampiros com a luz do Sol: qualquer vela ou
lâmpada emite luz no visível e qualquer pessoa ou fonte de calor emite radiação
no infravermelho (por isso que nos filmes de guerra moderna, sempre tem alguma camera de
visão noturna que capta o infravermelho das pessoas), e vampiros não dão
chilique perto de velas ou pessoas... Ora, o problema então só pode ser o ultravioleta!!!! Alguém
pode me explicar porque os vampiros não podem usar protetor solar???? O
creminho colorido pode ser feio, mas o protetor solar é transparente!!!!! Podemos pensar que o ácido para-aminobenzóico só bloqueia parte da radiação
ultravioleta, mas já existem misturas com outras substâncias que absorvem o resto da região do
ultravioleta para fazer protetores solares mais eficientes, que absorvem toda a radiação
ultravioleta que escapou de ser absorvida pela camada de ozônio (aliás, se não
fosse a camada de ozônio, nem nós que não somos vampiros escaparíamos! É a camada de ozônio que absorve quase
que completamente a parte mais perigosa do ultravioleta que o Sol emite).
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Ácido para-aminobenzóico |
Outra coisa interessante sobre
protetores solares é o modo como se classifica o fator de proteção solar de
cada um, o tal do FPS que vem nas embalagens. Quando usamos um protetor com FPS
20, quer dizer que podemos ficar expostos ao Sol 20 vezes mais que sem protetor
solar antes de ter um eritema (o vermelhão causado pela exposição ao Sol). Se demora 20 minutos para ficar com cor de
camarão sem usar protetor solar de FPS 20, demora 400 minutos para ficar com
cor de camarão usando protetor solar de FPS 20. Estes valores são obtidos em
testes com pessoas ou com uso de equipamentos que medem a radiação que passa
pelo protetor solar. Porém, é importante saber que para determinar o FPS do
protetor, a norma pede para espalhar 2 mg de protetor por centímetro quadrado
de pele. Estudos mostram que o usuário descuidado não espalha um terço disso, gerando uma
falsa sensação de proteção. Para evitar esse problema, já há algumas invenções
para nos alertar quando estamos muito expostos à luz do Sol. Inventaram até um
bikini que muda de cor quando exposto ao Sol por tempo maior que o saudável.
Uma tendência em pesquisas nessa
área é estudar novas substâncias para uso em protetores solares que absorvam cada
vez maior extensão da região do ultravioleta, oferecendo maior proteção. Não é fácil achar uma substância para atuar em protetores solares: ela deve ser estável quando exposta ao Sol, deve absorver a luz na
região do ultravioleta e liberar a energia absorvida em uma forma inofensiva
como infravermelho ou luz visível, não pode ser tóxica e deve ser transparente.
Alguns pesquisadores buscam novas substâncias na natureza para servir como
protetores solares e aí o Brasil tem vantagem pela grande biodiversidade à
disposição e experiência no trabalho com produtos naturais. Vampiros tem se
mostrado tão burros, que se algum quiser virar cientista e for trabalhar nesta
área, é capaz de querer extrair alguma substância fotoprotetora do alho! Seria
como algum lobisomem resolver usar um piercing de prata...
Leitura feita para a elaboração desse texto